
O plenário do Senado aprovou no último dia 28 a Proposta de Emenda Constitucional (PEC 19/2014) que inclui a acessibilidade e a mobilidade entre os direitos fundamentais estabelecidos no artigo 5º da Constituição Federal.
Embora tenha dormitado por longos sete anos no Senado, e ainda dependa da apreciação da Câmara Federal, quando aprovada ali a chamada ‘PEC da Acessibilidade’, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), garantirá, enfim, que as pessoas portadoras de deficiências (PCD) tenham seu direito à mobilidade e à acessibilidade constitucionalmente reconhecido.
O último censo do IBGE (2010) apontou que 24% da população eram portadores de algum tipo de deficiência física. Significa, em tese, que hoje mais de 45 milhões de brasileiros precisam enfrentar os desafios de locomoção e de acesso ao trabalho, ao lazer e aos serviços públicos e privados, superando obstáculos que vão de vias urbanas sem estrutura adequada, à falta de simples rampas não só em estabelecimentos comerciais, mas até em edifícios governamentais.
Embora a instituição do Estatuto do Idoso (Lei 10.731/2003) e, especialmente, do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.143/2015) tenha assegurado significativos avanços relativos à mobilidade e acessibilidade desses importantes segmentos de nossa população, em geral o Brasil ainda está longe de lhes garantir condições razoáveis de transporte urbano, locomoção pessoal (cadeirantes, deficientes visuais) e de acesso.
É certo que muitas cidades do país registram empenho importante do poder público na paulatina adequação do transporte e dos equipamentos urbanos às condições das pessoas com deficiência. Como resultado de mobilização de organizações sociais e de bissextas – mas eficientes – campanhas publicitárias, a sociedade como um todo parece cada vez mais consciente da importância social, econômica e, sobretudo, humana, de se garantir segurança e autonomia aos portadores de limitações de mobilidade.
Porém, há um longo caminho a percorrer até que pelo menos a grande maioria das pessoas com deficiência possa ter a efetiva garantia de acessibilidade. Para se ter uma idéia da desafiadora tarefa, que não é só dos governos, mas de toda a sociedade, vale a citação literal do Inciso I do Artigo 3º do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que define:
“Acessibilidade: possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida.”
Por aí temos os contornos de um território ideal que, delineado pelo legislador com os pressupostos e premissas de política pública e de senso de responsabilidade coletiva – centrados no respeito e na valorização da pessoa com deficiência –, exige o empenho consciente de governos e da sociedade para torná-lo real, inclusivo e solidário.
Exatamente por isso, a aprovação, pelo Senado, da PEC 19/2014, que inclui a acessibilidade e a mobilidade entre os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, constitui um novo e alentador paradigma na árdua trajetória das pessoas com deficiência em busca da inclusão efetiva, do reconhecimento de seus valores – não de favores ou ‘concessões’ – e da garantia de que sua plena cidadania não estará condicionada à natureza ou dimensão de suas limitações.
Uma vez que se tem como certo que a Câmara Federal aprovará em breve tão providencial Emenda Constitucional – que, como tal, será automaticamente homologada, sem ir à sansão presidencial –, é auspicioso constatar que, com a ‘PEC da Acessibilidade’, o Brasil se torna mais contemporâneo da perspectiva humana e social.
*Iran Coelho das Neves é Presidente do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul.